quarta-feira, 22 de abril de 2015

Olá, sou uma bomba

Olá, sou uma bomba,
sim, sou uma bomba,
acabei de nascer, não vos vou dizer do que sou feita,
é segredo militar, mas o meu corpo é uma compota
de materiais compósitos e de concentrado de ameixa,
diz o meu manual em inglês e alemão que sou para desfazer
em estilhaços e vapor tóxico, daquele que não evapora,
mato bem e de repente, pena é não poder ver morrer
os seres que vou matar, queria vê-los com a língua de fora

Sou uma bomba e estou num armazém,
bolas, ainda não vou matar,
por cima de mim, por baixo, de lado, estão mais bombas como eu,
parece-me que têm mais calibre e estão a protestar, a resmungar,
também estão desertas para matar e o caldo delas já arrefeceu,
o meu ainda está meio quente, vou ter que ser muito paciente,
sou uma bomba proibida pelas convenções, mas não me interessa,
nasci para explodir e para matar, portanto vou matar toda a gente
que respirar os meus gazes letais de cloro, de sarin e de merda

Esperem, ouço vozes,
dizem que nos vão colar a helicópteros,
que adrenalina, meu deus, vou voar, vou cair a pique no chão,
estou tão entusiasmada, vou matar, já estão a tirar os suspensórios
que agarravam o meu cu electrónico à prateleira, já estava com comichão,
aí vou eu a caminho do hangar, vou devagar, levam-me com cuidado,
se eu me viesse agora só morreriam estes miseráveis soldados
e eu fui feita para matar muita gente, mas já estou encaixada no lado
esquerdo deste helicóptero todo preto, já estão lançados os dados

Urra, urra, levantei voo,
sou uma bomba inteligente,
vou queimar o trigo e o joio,
vou matar muita gente

Urra, urra, já estou a cair,
o meu tesão está ao rubro,
urra, já caí, estou a explodir,
vim-me sem fazer barulho

E depois vemos o jornalista, o fotógrafo, o repórter,
o funcionário da ONU,
a vaguearem abstractos por cima de corpos
inchados, gaseados, a morte veio de helicóptero,
foi assim na Síria, eram dezenas e estavam mortos,
e a tecnologia mostrou tudo ao mundo,
porra, estamos todos a ir ao fundo,
porra, poupem, pelo menos, as aves
porra, poupem, pelo menos, as árvores

Ó Homem inteligente,
por que razão continuas a fabricar armas?
Ó Homem combatente,
por que razão não combates somente
com a força das tuas palavras,
com a força do teu corpo, com a força da tua mente?
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Hoje é o Dia da Terra